1 INTRODUÇÃO
O Inventário Extrajudicial tem um papel crucial no sistema jurídico brasileiro, sendo um dos maiores avanços para a desjudicialização dos procedimentos sucessórios. Desde a promulgação da Lei nº 11.441/2007, ele passou a permitir que herdeiros maiores e capazes resolvam questões patrimoniais de forma ágil e segura. No entanto, tem-se observado uma resistência por parte de instituições financeiras quanto à liberação de valores provenientes do espólio, mesmo em inventários realizados extrajudicialmente, o que configura uma afronta à fé pública do tabelião.
Neste artigo, analisaremos a relevância do inventário extrajudicial, os poderes conferidos ao inventariante pela Resolução nº 35/2007 do CNJ, os abusos praticados pelas instituições financeiras e as soluções propostas para que a fé pública dos atos notariais seja devidamente respeitada.
2 A IMPORTÂNCIA DO INVENTÁRIO EXTRAJUDICIAL
O inventário extrajudicial trouxe celeridade aos procedimentos de partilha, desobstruindo o Judiciário e proporcionando maior segurança jurídica aos herdeiros. A escritura pública lavrada pelo tabelião de notas tem o mesmo efeito de uma sentença judicial transitada em julgado, o que confere ao procedimento extrajudicial plena validade jurídica.
Como aponta Veloso (2018), a fé pública conferida ao tabelião de notas garante que seus atos, incluindo a escritura pública de inventário, são revestidos de presunção de veracidade. Apesar disso, as instituições financeiras têm resistido à execução de ordens amparadas em inventários extrajudiciais, muitas vezes desconsiderando a autoridade do inventariante designado na escritura pública.
3 OS PODERES DO INVENTARIANTE E A RESOLUÇÃO 35/2007 DO CNJ
A Resolução nº 35/2007 do CNJ estabelece que o inventariante, seja em inventário judicial ou extrajudicial, possui os mesmos poderes, inclusive para movimentar contas bancárias, administrar o espólio e representar o espólio ativa e passivamente. Assim, não há justificativa para que as instituições financeiras exijam alvarás judiciais ou outros documentos adicionais em caso de inventário extrajudicial.
Conforme a Resolução, o inventariante é o representante legal do espólio e tem legitimidade para praticar todos os atos administrativos necessários. A recusa das instituições financeiras em aceitar essa legitimidade fere não apenas os direitos dos herdeiros, mas também a segurança jurídica do processo sucessório (BRASIL, 2007).
4 ABUSOS DAS INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS
O comportamento abusivo das instituições financeiras em relação aos inventários extrajudiciais inclui:
- Exigência de alvarás judiciais para liberação de valores do espólio, mesmo com a escritura pública validamente lavrada.
- Negativa de fornecimento de informações bancárias ao inventariante, sob pretexto de sigilo bancário, impedindo a administração eficaz do espólio.
- Demora excessiva na liberação de recursos financeiros, prejudicando o andamento do inventário.
Essas práticas contrariam diretamente os preceitos da Resolução nº 35/2007 e desrespeitam a função pública do tabelião de notas. De acordo com Dias (2019), a recusa das instituições financeiras em acatar as ordens de inventário extrajudicial representa uma violação dos princípios da boa-fé objetiva e da função social dos contratos.
5 SOLUÇÕES E PROJEÇÕES PARA O RESPEITO À FÉ PÚBLICA E À FORÇA JURÍDICA DO INVENTÁRIO EXTRAJUDICIAL
Diante dos abusos relatados, algumas medidas podem ser propostas para garantir que as instituições financeiras respeitem a fé pública dos atos notariais e a força do inventário extrajudicial:
- Capacitação das instituições financeiras: Implementação de protocolos claros e específicos para o atendimento de inventários extrajudiciais, conforme preceitua a Resolução nº 35/2007 do CNJ.
- Fiscalização mais rigorosa: Os órgãos reguladores, como o Banco Central do Brasil (BACEN) e a Comissão de Valores Mobiliários (CVM), devem estabelecer diretrizes claras para que as instituições financeiras respeitem os direitos dos inventariantes.
- Judicialização das condutas abusivas: Em casos de abuso ou mora excessiva, os herdeiros e inventariantes podem buscar reparação judicial, pleiteando indenizações pelos danos causados.
- Valorização do papel do tabelião: O reforço da confiança nos atos notariais é fundamental para que a desjudicialização continue sendo uma solução eficaz. A fé pública deve ser inquestionável.
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
O inventário extrajudicial representa um avanço significativo para a desjudicialização dos procedimentos sucessórios, oferecendo uma solução rápida e eficiente para os herdeiros. No entanto, a resistência das instituições financeiras em reconhecer a legitimidade dos atos notariais, especificamente a figura do inventariante extrajudicial, compromete a celeridade e a segurança jurídica do processo.
A implementação de medidas corretivas, como a capacitação das instituições financeiras e o fortalecimento da fiscalização pelos órgãos reguladores, são soluções necessárias para garantir o pleno respeito à fé pública dos atos extrajudiciais e à força jurídica da escritura pública de inventário.
REFERÊNCIAS
BRASIL. Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Resolução nº 35, de 24 de abril de 2007. Disponível em: https://atos.cnj.jus.br. Acesso em: 24 out. 2024.
DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Sucessões. 5. ed. São Paulo: RT, 2019.
VELOSO, Zeno. Direito Notarial e Registral Brasileiro. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2018.